segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Lusofónico

Já que alguns amigos revelaram apreciar esta prosa atribuída ao escritor luso Fernando Pessoa, transcrevo-a.


PALCO DA VIDA

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes mas, não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo, e posso evitar que ela vá à falência.

Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise. Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.

É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida. Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um "não". É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.

Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo...

(Fernando Pessoa - Lisboa, 13.06.1888 — Lisboa, 30.11.1935)

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Serra, desculpa! Valeu?

Vão dizer que é para tirar vantagem da imagem de "coitadinho". Não importa. Hoje, em minha cidade natal, o candidato oposicionista José Serra (PSDB) foi agredido enquanto fazia corpo a corpo eleitoral. Ainda não sei - e nem quero saber - quem o agrediu, só sei que foi no Rio de Janeiro.

Por isso, eu, carioca, quero pedir desculpas ao senhor José Serra. Não votei nele, nem lhe tenho simpatias, mas em meu próprio nome e em nome de milhões de cidadãos desta terra luminosa que, pela Providência, é lugar de tantas histórias gloriosas e outras nem tanto, mas que é, queiram ou não, nevrálgica na vida brasileira, é que eu me desculpo pelo acontecido nesta quarta-feira.

É preciso que se diga ainda que a maioria dos cariocas, gente de bem, ordeira e civilizada, não pactua com a barbárie e que, apesar do ocorrido, qualquer pessoa pode vir à nossa cidade, que não obstante seus variados problemas e mazelas, ainda é no coração de toda gente a Cidade Maravilhosa.

É verdade que ainda lutamos contra excrecências sociais que brotam qual ervas daninhas de distorções sociais, políticas e econômicas. Esta é uma terra de contradições, de virtudes abortadas e pecados à flor da pele, caótica e anárquica. Mas é também uma terra de generosidades, de bons vizinhos, de gente solidária e que faz graça de suas misérias e vai vivendo apesar dos tombos que leva amiúde. É um lugar onde a bandidagem é capaz até de esquecer que é bandida quando
alguém diz "- Oh! Glória!". Que me perdoem bairristas de outros lugares, aqui é o melhor lugar do mundo. Na capital da cordialidade, sua gente é gentil. Olhem nas ruas e confiram que "ela é carioca, ela é carioca, basta o jeitinho dela andar..."

Nossas famílias querem inclusão; não queremos ser tratados como suspeitos do tráfico nem da violência. Nossa gente precisa é de justiça, de educação, de saúde. E da maior de todas as políticas públicas: a gentileza.

No Rio, seja Dilma ou Serra, direita, centro ou esquerda, os cariocas querem paz, amor, ordem e progresso.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Uma nova mitologia latino-americana



Vivendo e aprendendo. Essa história chilena dá-nos muitas lições.
Destaco que há um paralelo entre a região de Atacama (que mantém algumas correlações com a noção de tártaro, inferno, com terrenos nus, pedregosos, salinos) e certas paisagens da Grécia e ilhas do Egeu, com seus cenários vulcânicos, dos quais a mitologia narra coisas fantásticas que permaneceram como forma para uma vasta explicação da vida e símiles filosóficas que estão espalhadas por todas as áreas do conhecimento.
Sabemos que, em geral, os povos herdeiros de antigas civilizações (gregos, persas, chineses, japoneses etc) tiveram séculos de enfrentamento com as ameaças climáticas e catástrofes naturais, estando na frente de outros povos mais recentes (o Brasil, por exemplo). À exceção, no continente americano, dos herdeiros de antigas civilizações (maias, astecas, incas etc.), que foram subjugadas e dizimadas pelo colonialismo europeu, aqueles primeiros desenvolveram saberes refinados que só puderam ser atingidos exatamente porque lutaram muito pela própria sobrevivência, sendo provados de todos os modos e legando ao mundo histórias narradas, claro que sem cientificismo, mas mitologias que nos encantam e ilustram pelas alegorias com as dificuldades, perdas e ganhos de cada um de nós no dia-a-dia da modernidade.
Curiosamente, na cultura ibero-americana, destacaram-se seis escritores (contadores de histórias) que brotaram justamente das culturas em que há traços remanescentes das antigas civilizações pré-colombianas, com o prêmio Nobel de literatura: Gabriela Mistral (Chile, 1945), Miguel Ángel Asturias (Guatemala, 1967), Pablo Neruda (Chile, 1971), Gabriel García Márquez (Colômbia, 1982), Octavio Paz (México, 1990) e agora, Mario Vargas Llosa (Peru, 2010). O Brasil, a mais forte economia latino-americana, ainda não emplacou um Nobel, embora Josué de Castro, Herbert de Souza (Betinho) e Milton Santos o merecessem.
A saga dos 33 mineiros de Copiapó mobilizou, no mesmo ano em que o país foi arrasado por um grande terremoto, os meios de comunicação do mundo inteiro para contar uma história, que até se pode chamar de milagrosa, de pessoas singelas e carregadas de sua humanidade. Isso deu notícia, vai dar livro e versões para cinema e TV.
Aprendi que, em vez de valorizarmos a terra que não tem terremotos, maremotos nem furacões, devemos mesmo é valorizar o gênio, a sagacidade, a resistência e a resiliência de um povo que acredita que, sim, é possível superar suas desgraças e tem a altivez de não aceitar ser encabrestado por quem quer que seja, venha de dentro ou de fora!
Nosso papel é influir na formação do caráter desse povo jovem com os princípios do Evangelho, da graça, do amor, da solidariedade e ajudar a modelar o perfil da raça brasileira, sem amputá-la de sua coragem, determinação e consciência do papel a desempenhar.
No resto, parabéns aos chilenos. Eles têm sabido superar os modelos autoritários, consolidar sua economia, fortalecer o papel das instituições e descobrir o caminho da ascensão civilizatória no concerto das nações.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Do segundo turno à alternância

Contudo, Nínive tem mais de cento e vinte mil pessoas que não sabem nem distinguir a mão direita da esquerda, além de muitos rebanhos. Não deve­ria eu ter pena dessa grande cidade?

(Jonas 4.11)


Houve um tempo romântico em que, para ocupar-se cadeira de parlamentar, o sujeito tinha de exibir moral ilibada e extensa folha de serviços prestados à sociedade. Também houve um tempo em que era praxe os partidos políticos se alternarem no poder, num revezamento que dava oportunidades iguais às agremiações políticas para apresentar o seu estilo de governança e demonstrar suas virtudes pela indicação de um monarca de barbas grisalhas.

O tempo passou e, contrariando certa tese que diz que as coisas se aperfeiçoam quando o tempo passa, a política brasileira eleva ao degrau mais alto do legislativo nacional gente que tem intimidade com a telinha ou com a bola: Tiririca, Romário, Jean Willys entre outros. E quase acaba diplomando candidatas honoráveis tais quais a ‘Mulher Pera’, a Mulher ‘Melão’ e Tati Quebra Barraco. Se no passado houve barões do café, voto de cabresto, coronéis do cacau, imaginava-se que o século 21 seria bem diferente.

Passamos mais uma eleição sem lideranças expressivas nem nomes de valor inquestionável. Sobraram nulidades, bizarrices e mistificadores de todo tipo. No entanto, dá para aprender algumas lições valiosas.

Lula, por exemplo, pertence a um panteão sagrado e não pode ser abalado por críticas de pessoas mortais. Mesmo assim, sua candidata, Dilma, não encaçapou no primeiro turno.

A ‘verde’ Marina foi providencialmente a peça que desestabilizou o “já ganhou” da candidata vermelha e o povo escolheu o segundo turno como candidato. Enquanto isso, Serra, o ‘tucano’ da campanha fraca, foi abençoado com uma segunda oportunidade, indo para o ‘tudo ou nada’.

Em novembro, a decisão pode confirmar o sucesso do uso da máquina governamental pró Dilma ou, para melhorar a democracia, os brasileiros e brasileiras podem dar preferência à alternância no poder. Esta sim, uma opção menos de aprovação de José Serra e o estilo peessedebista de governar do que o desejo sincero por um arejamento no Planalto.

Votar na alternância não é o mesmo que rejeitar Dilma ou o PT. Muito menos confessar-se apaixonado pelo charme de José Serra, FHC e outros compadres social-democratas. Alternar, neste caso, é dar ao PT a oportunidade, que o imediatismo do poder não lhe permite enxergar, de se reciclar, de retornar mais humilde e amadurecido em 2014.

Se o voto confirmar mais um período petista no Executivo federal, o ‘circo’ que conta em seu elenco com o palhaço Tiririca vai armar sua lona em Brasília e, “ninguém disse, ‘seu’ Zé”, mas digo eu: fará um espetáculo sem graça, com feras fora de controle a devorar os direitos e liberdades individuais do respeitável público, que às vezes não sabe como usar a mão esquerda nem a direita para teclar o botão verde da urna eletrônica porque não sabe que é o povo quem manda no Estado.


LUCIANO P. VERGARA