sexta-feira, 17 de outubro de 2014

ADVERSUS QUAE FAVORABILIS

Sobre a posição assumida nas eleições pelo amigo Clemir Fernandes, e que deve ser respeitada. Admiro-o incondicionalmente. E as eleições não influenciarão minha opinião sobre um amigo. Nesta eleição, tenho a expectativa de que a alternativa (que agora tem a estampa do Aécio e da coligação liderada pelo PSDB) saia vitoriosa, pois acredito que, à permanência do mesmo grupo político à frente do Estado, é preferível a alternância, mesmo para um fragmento político tão imperfeita e incoerentemente chamada de maioria da população, mas que contempla as necessárias mudança e renovação no exercício do poder. Este continuísmo, sim, é lesivo à democracia, muito mais do que um governo eventualmente fraco. Em qualquer sistema, um governo como o de Dilma, que leva a economia ao fracasso, merece ser substituído. E isto não tem a ver necessariamente com ideologia; é pragmatismo na gestão de sistemas complexos. Acontece algo parecido com excelentes técnicos de futebol, quando fracassam, e com comandantes que perdem a batalha.

INVESTIGUEM-ME

Também quero apimentar um pouco mais a discussão do mérito de Dilma Rousseff nas investigações que atingem diretamente gente grande de seu governo e de empresas como a Petrobras. Na verdade, a corrupção chegou ao Brasil com a frota de Cabral, portanto antes do Império e até da Colônia. Ela era endêmica em um tempo de administração centralizada, quase sem instrumentos de controle e acompanhamento. Na verdade, a corrupção está apegada ao ser humano. Mas a corrupção nas coisas públicas, que já existia até mesmo antes de se ter um funcionalismo profissional (invenção dos estados organizados a partir de fins do século 18). No cenário em que se vislumbram os militares escondendo a corrupção, não dá para dizer que eles seriam naturalmente corruptos, mas às vezes se supõe que a corrupção desse período era natural, só que não "vazava", por causa do controle que exerciam sobre a imprensa. Claro que a corrupção, e de resto todo o pecado da espécie, continuou sua obra, mesmo com a moralidade conservadora dos fardados. Mas a tese de que é mérito do governo petista a ampliação das investigações, espera lá... Que papel a informática e o controle eletrônico tiveram na qualificação dos investigadores? Que motivações estariam na origem de muitas denúncias, a maioria de natureza fiscal (interesse fundamental para a saúde financeira do governo)? Que efeito o aparelhamento da imprensa para reportagens investigativas teria sobre o rumo das investigações, independentemente de quem está no Planalto? E a criação do Ministério Pùblico, antes doe o PT assumir o poder? Ou o crescimento institucional do STF e a surpreendente atuação de Joaquim Barbosa? As suposições de que Dilma seria moralmente exemplar parecem esquecer de que os investigadores também têm o seu orgulho e fariam seus nomes ao nocautear graúdos (vários delegados têm buscado carreira na política ou "surfam" na notoriedade como "xerifes" da luta contra o crime). Acredito que no período dos militares tenha, sim, havido corrupção (nem maio nem pior do que hoje). Mas como visto, sempre é possível supor de tudo, até mesmo que os militares teriam escondido a corrupção enquanto Dilma a teria combatido mais que os outros. É apenas uma opinião, mas penso que alguém que não nega seu passado no crime de roubo a bancos, seqüestro e falsidade ideológica de identidade jamais se tornaria um exemplo de compostura ética e moral.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

DIALOGANDO COM O TEXTO DE MACÉIAS NUNES

O amigo jornalista e pastor Macéias Nunes escreveu artigo, publicado pela Agência Cristã Soma, comentando o significado e as conseqüências do Templo de Salomão, não o original, em Jerusalém, mas seu sucessor (sic!), em São Paulo, obra da Igreja Universal do Reino de Deus. Li-o, gostei, mas observei um detalhe que, se não concorda com Macéias, ao menos é percepção que tenho de uma figura que, acho, merece mais conhecimento e apreço de todos os brasileiros. A análise do excelente Macéias é muito bem feita. Pontuo contudo que a referência a D. Pedro II mereceria abordagem mais justa, pois assim superficialmente joga vala abaixo uma das figuras mais exemplares em termos de honestidade e ética no trato das coisas públicas que já tivemos no Brasil, especialmente quando comparamos o monarca, tido como o mais sábio dentre os chefes de estado do século 19, com os presidentes mequetrefes cujos fundilhos têm aquecido o primeiro assento do Palácio do Planalto. Pedro II foi um chefe vitorioso em vários embates que ameaçaram a integridade do Brasil e a projeção do país na América do Sul. Mas, como homem de seu tempo, não conseguiu enxergar a virada de uma era e se desgastou além da conta com as arcaicas e ignóbeis estruturas sócio-políticas do Brasil escravocrata, agrário e latifundiário, embora ele mesmo se pretendesse um homem moderno e amante das liberdades.
O Templo de Salomão da Igreja Universal e os lírios do campo de Jesus Macéias Nunes* (21 Agosto 2014) O Templo de Salomão da Igreja Universal e os lírios do campo de Jesus Salomão é o ícone bíblico dos que entendem que prosperidade e riqueza são necessariamente sinônimas de bênção divina. O que não se leva em conta é que, em sendo assim, no caso do filho de Davi com Bateseba, essa bênção custou muito caro ao povo israelita, obrigado a pagar impostos extorsivos para custear o esbanjamento da corte. Custou muito também aos estrangeiros explorados como escravos por Israel. Mão de obra barata é sempre uma grande tentação para quem, ao contrário do que profetiza Gênesis 3.19, ganha a vida com o suor do rosto alheio. Mais ainda: pela desastrada política levada a termo por Roboão, representou a própria derrocada do Reino Unido. Isso sem falar na política externa salomônica, muito pouco compatível com a propalada sabedoria homônima. Manter 700 mulheres e 300 concubinas, muitas delas princesas de reinos com quem Salomão mantinha alianças econômicas e militares, não é para qualquer um. No final, em nome dessas alianças, ele acabou tendo que prestar culto aos deuses dessas nações. O rei Salomão Figura notável como intelectual, administrador e diplomata, Salomão foi um desastre como um monarca que realmente estivesse interessado no bem estar de seus súditos. Suas prioridades eram sua própria pessoa e a manutenção da estrutura de poder que fazia dele um soberano internacionalmente admirado. Mal comparando, ele foi uma espécie de Dom Pedro II antigo, que, para legitimar ainda mais a comparação, também não conseguiu manter o reino. A pobre Princesa Isabel nem chance teve de comandar a transição entre o regime escravocrata que abolira e um terceiro reinado provavelmente mais justo e menos turbulento do que a República que se seguiu. Roboão, por seu turno, subiu ao trono aos trancos e barrancos, como um mandatário totalmente despreparado, e no primeiro teste mais duro que enfrentou, aconselhou-se mal, endureceu a política econômica equivocada do pai e perdeu, da noite para o dia, as dez tribos do norte, que constituíram o Reino de Israel. Jesus e os lírios do campo Quando comparou a glória de Salomão aos lírios do campo, Jesus fez a crítica implícita a esse estilo de vida majestoso, no sentido caricatural, adotado pelo herdeiro do trono de Davi. Em toda a sua glória – às custas do sacrifício do povo – Salomão não conseguiu chegar à perfeição, em termos de imagem e aparência, que uma simples flor já traz do berço, que não é de ouro, mas também não precisa ser. É a criação divina, em sua pureza, simplicidade e beleza. Em termos dessa perfeição natural, nenhuma criatura no universo criado, o homem incluído, cria coisa alguma. Como não existe o ser humano perfeito por natureza, também não existe a obra humana perfeita. O Templo de Salomão da Igreja Universal Os construtores do já famoso Templo de Salomão em São Paulo, cuja grandiosidade não se pode negar, posto que construído com o suado salário do órfão e da viúva, deveriam estudar melhor a vida do rei que dá nome ao edifício. Ele não foi um exemplo de homem justo com seu povo e fiel a seu Deus. Foi um político auto-referenciado, indiferente às demandas reais da população. Não soube encaminhar a transição do trono, deixando de preparar seu filho para os novos tempos. Deixou-se levar pela politicagem da corte e pelos compromissos com seus aliados, desviando-se, por isso, dos retos caminhos do Senhor e mergulhando na idolatria. E o Templo de Salomão, sua obra mais imponente, acabou destruído pelos babilônios. Enquanto isso, os lírios do campo continuam a vestir-se, séculos afora, com a mesma glória que o Criador lhes concedeu. * Macéias Nunes é Jornalista www.soma.org.br