terça-feira, 7 de setembro de 2010

O nosso nome é Francenildo

Da luta entre o gigante guerreiro Golias e o menino Davi, cedo aprendemos que Deus ajudou o menino a vencer o primeiro. Aprendemos a história da luta entre o rude e abusado filisteu e o ruivo guri que fedia a curral de ovelhas na Bíblia (primeiro livro de Samuel, capítulo 17). A lição é que Deus se coloca ao lado de quem nele confia e não se estriba em suas próprias fama, força e habilidade.
A eleição de 2010 traz de novo a cena preservada por um cronista de Samuel. Não tem muito tempo, apareceu por aqui durante o primeiro mandato de Luís Inácio Lula da Silva. Novamente, ela conecta a presente quadra da vida brasileira ao panorama bíblico e expõe gravíssimo risco à brava gente.
Não! Não tem nada a ver com a filha do tucano José Serra – Verônica – cujo sigilo na Receita Federal, em 2009, foi o prato de duas invasões de arapongas de estrelinha vermelha. Eu me refiro a outra coisa.
Lembra que o então ministro da Fazenda, Antônio Pallocci, em 2006, sustentou uma polêmica com um caseiro piauiense, de nome Francenildo, que supostamente teria recebido dinheiro para caluniar o ministro e várias personalidades pela suspeita de uso irregular de uma mansão no Lago Paranoá, em Brasília, para conchavos políticos? Pois então, o caso de Verônica é, simplesmente, a tampa da Caixa de Pandora, da qual procederão as mais malignas catástrofes, se nada for feito para fechá-la a tempo.
Muito mais que atingir a débil candidatura do PSDB à presidência ou demais caciques social-democratas cujos segredos foram igualmente violados, assusta o fato de os “filisteus” do politburo trabalhista ensaiarem o que farão à indiazada toda por longo tempo, caso a estrela do PT não se desgrude do Planalto para oxigenar a alternância do poder.
Ora, se paus mandados bolcheviques entram no sistema da Receita e passeiam pelo sigilo fiscal de personalidades, do tipo “cachorro grande”, da política nacional, que é a gente do naipe e da visibilidade desses graúdos, o que não farão aos anônimos assalariados e pequenos e médios empreendedores distribuídos pelas alta e baixa Classe Média, que são os maiores pagadores de impostos e quem movimenta boa parte da renda socialmente relevante do país? O golpe é tão brutal que põe sob suspeita toda a máquina fiscal.
De vários cantos da América Latina, em laboratórios de sociedades do medo, como Cuba, Venezuela, Bolívia e, recentemente, Argentina e Equador, prodigalizam-se episódios de raro retorno às trevas do autoritarismo sindical leninista. A Classe Média é lançada no colo da esquerda retrógrada pelo medo do pólo oposto, onde empresários conservadores e magnatas da vida rural ainda guardam o bafo das ditaduras de direita. Sementes que hibernaram dos anos 1960-70 e a Guerra Fria desabrocham no Paraguai, Uruguai e quiçá no Peru, com novos mandatários fichados nos anais da repressão por terem atuado na clandestinidade.
O ímpio gigante será um desafio hercúleo a vencer se o pequeno “Davi” não se dispuser a enfrentar o monumental mostrengo. Pallocci está na cúpula da campanha de Dilma Roussef e, junto com os caciques petistas, sua trajetória novamente coincide com a arapongagem governamental e a figura do “estado Leviatã”, concebida recentemente por João Ubaldo Ribeiro (O Leviatã pega, O Globo, 08/08/2010).
Calma, porém. A lição tirada da Bíblia mostra a vitória da criança ingênua mas resoluta em sua confiança em Deus. No caso brasileiro, “Davi” é Francenildo, o herói do povo, o “Zé” que dos poderosos se vinga com as mãos limpas e com a verdade, pois quem não deve não teme. E, diante da definitiva ameaça da versão verde-e-amarela do estado policial, no qual faltará o abrigo das liberdades individuais, do direito à preservação de dados pessoais e dos assuntos da vida íntima perante a indiscrição do Grande Irmão (pensou em 1984, de George Orwell?), só nos restará dizer que doravante todas as pessoas do povo se chamarão Francenildo.