quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Alguém sabe onde está o fusquinha do irmão André?



Em O Globo da quinta-feira, 16.09.2010, o editorial abordava a postura antidemocrática que o ex-deputado e ex-ministro José Dirceu, cassado por causa de seu envolvimento no escândalo do “Mensalão”, vem demonstrando quanto ao papel da imprensa. Na opinião do jornal Dirceu está vivamente interessado em concretizar uma antiga proposta do Partido dos Trabalhadores de restringir o peso da imprensa.
A tese do editorial é que o PT, desde que chegou ao poder, não esconde que, à semelhança do casal Kirchner, na Argentina, e o mandatário venezuelano Hugo Chávez, sem excluir os outros potentados latinoamericanos com tendência ao autoritarismo de equerda, o governo deve limitar o número e o tamanho de empresas de comunicação, por meio de regulações acionárias no mercado e intervenções de um comitê regulador sobre os diversos conteúdos.
A tese pode ser ou não a expressão da verdade. Mas a intenção de controlar a imprensa com mão de ferro é uma realidade que vem assombrando toda a América do Sul desde meados desta década. A se confirmar a tese, irá consubstanciar-se o primeiro império sindical do planeta, um fruto plantado pelas velhas burocracias bolcheviques que chega a vingar no hemisfério sul.
Se tal acontecer (e não estamos tão longe disso!), a imprensa não será a única a ser amordaçada. É apenas a primeira. A bola da vez passaria então às igrejas.
Imprensa e igreja são versões do mesmo sentimento. Ambas estão em busca da verdade. Ambas se dedicam a proclamar, a anunciar, a abrir os sentidos da sociedade. Ambas incomodam as aspirações hegemônicas com suas denúncias proféticas, vaticinando tendências e resultados de curto, médio e longo prazos. Imprensa e igreja, embora tenham um parentesco complicado que as leva, muitas vezes, a análises e propósitos conflitantes, têm entre si a mesma essência marcada pela indignação contra as injustiças.
Não à toa, João Wesley enxergava a utilidade do binômio Bíblia-jornal e tanto recomendava a seus pregadores que se atualizassem pela leitura de informativos quanto se definia como “homem de um único livro” (a Bíblia). Apesar das tensões do parentesco, Imprensa e Evangelho não são excludentes, mas complementares. A Igreja genuína proclama a verdade revelada, a imprensa séria mostra a verdade dos fatos. Uma, fala com amor e cuidado pastoral, a outra, com incisividade e sem amarras litúrgicas.
Por isso, aqueles que ambicionam o poder acima do controle das instituições detestam os conselhos e advertências das duas vozes da consciência social presentes na religião e na imprensa. Se hoje a imprensa é atacada e impedida de cumprir o seu papel sagrado sem que a sociedade reaja a esse golpe, amanhã será a vez da religião ser agredida e silenciada.
A permanência de um superpartido no poder leva a efeito o de que José Dirceu foi acusado: a “mexicanização” (referência às mais de sete décadas de pontificado do Partido Republicano Institucional no México). O Brasil, maior país católico, que é também a terra de vertiginoso crescimento evangélico, corre o risco de “sovietização”. Assim foi com as repúblicas da “Mãe Rússia”, que amargaram 70 anos de hipercontrole comunista retrógrado. Idem com Judá, no passado, submetido a 70 anos de cativeiro em Babilônia.
Prova de que há um plano de alteração na ordem mundial, de mudança de eixos geopolíticos pela inversão social, marcada pela rebeldia e pelo descrédito nas instituições, é o avanço da diluição moral, intelectual e política a que assistimos na América Latina. Por que nesta região? Porque ela é frágil cultural e politicamente, mas tem uma razoável base econômica que daria a sustentabilidade que Che Guevara e os soviéticos enxergaram e quiseram trazer para o seu lado. E que melhor hora do que esta, quando a patrulha ideológica norte-americana baixa a guarda em função das crises moral e econômica dos EUA, com a diminuição de sua hegemonia para novos e poderosos agentes?
Caso o irmão André (o “contrabandista de Deus”) queira vender o seu fusquinha carregado de bíblias, vale uma boa oferta. Pode ser que ele volte à ativa no Brasil.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O nosso nome é Francenildo

Da luta entre o gigante guerreiro Golias e o menino Davi, cedo aprendemos que Deus ajudou o menino a vencer o primeiro. Aprendemos a história da luta entre o rude e abusado filisteu e o ruivo guri que fedia a curral de ovelhas na Bíblia (primeiro livro de Samuel, capítulo 17). A lição é que Deus se coloca ao lado de quem nele confia e não se estriba em suas próprias fama, força e habilidade.
A eleição de 2010 traz de novo a cena preservada por um cronista de Samuel. Não tem muito tempo, apareceu por aqui durante o primeiro mandato de Luís Inácio Lula da Silva. Novamente, ela conecta a presente quadra da vida brasileira ao panorama bíblico e expõe gravíssimo risco à brava gente.
Não! Não tem nada a ver com a filha do tucano José Serra – Verônica – cujo sigilo na Receita Federal, em 2009, foi o prato de duas invasões de arapongas de estrelinha vermelha. Eu me refiro a outra coisa.
Lembra que o então ministro da Fazenda, Antônio Pallocci, em 2006, sustentou uma polêmica com um caseiro piauiense, de nome Francenildo, que supostamente teria recebido dinheiro para caluniar o ministro e várias personalidades pela suspeita de uso irregular de uma mansão no Lago Paranoá, em Brasília, para conchavos políticos? Pois então, o caso de Verônica é, simplesmente, a tampa da Caixa de Pandora, da qual procederão as mais malignas catástrofes, se nada for feito para fechá-la a tempo.
Muito mais que atingir a débil candidatura do PSDB à presidência ou demais caciques social-democratas cujos segredos foram igualmente violados, assusta o fato de os “filisteus” do politburo trabalhista ensaiarem o que farão à indiazada toda por longo tempo, caso a estrela do PT não se desgrude do Planalto para oxigenar a alternância do poder.
Ora, se paus mandados bolcheviques entram no sistema da Receita e passeiam pelo sigilo fiscal de personalidades, do tipo “cachorro grande”, da política nacional, que é a gente do naipe e da visibilidade desses graúdos, o que não farão aos anônimos assalariados e pequenos e médios empreendedores distribuídos pelas alta e baixa Classe Média, que são os maiores pagadores de impostos e quem movimenta boa parte da renda socialmente relevante do país? O golpe é tão brutal que põe sob suspeita toda a máquina fiscal.
De vários cantos da América Latina, em laboratórios de sociedades do medo, como Cuba, Venezuela, Bolívia e, recentemente, Argentina e Equador, prodigalizam-se episódios de raro retorno às trevas do autoritarismo sindical leninista. A Classe Média é lançada no colo da esquerda retrógrada pelo medo do pólo oposto, onde empresários conservadores e magnatas da vida rural ainda guardam o bafo das ditaduras de direita. Sementes que hibernaram dos anos 1960-70 e a Guerra Fria desabrocham no Paraguai, Uruguai e quiçá no Peru, com novos mandatários fichados nos anais da repressão por terem atuado na clandestinidade.
O ímpio gigante será um desafio hercúleo a vencer se o pequeno “Davi” não se dispuser a enfrentar o monumental mostrengo. Pallocci está na cúpula da campanha de Dilma Roussef e, junto com os caciques petistas, sua trajetória novamente coincide com a arapongagem governamental e a figura do “estado Leviatã”, concebida recentemente por João Ubaldo Ribeiro (O Leviatã pega, O Globo, 08/08/2010).
Calma, porém. A lição tirada da Bíblia mostra a vitória da criança ingênua mas resoluta em sua confiança em Deus. No caso brasileiro, “Davi” é Francenildo, o herói do povo, o “Zé” que dos poderosos se vinga com as mãos limpas e com a verdade, pois quem não deve não teme. E, diante da definitiva ameaça da versão verde-e-amarela do estado policial, no qual faltará o abrigo das liberdades individuais, do direito à preservação de dados pessoais e dos assuntos da vida íntima perante a indiscrição do Grande Irmão (pensou em 1984, de George Orwell?), só nos restará dizer que doravante todas as pessoas do povo se chamarão Francenildo.